O ano em que meus pais saíram de férias.


Ontem tive o prazer de assistir O Ano Em Que Meus Pais Saíram de Férias, que foi o último filme do Paulo Autran.

O filme provavelmente foi barato, como quase todo filme brasileiro; mas é justamente aí que, segundo minha visão, está o segredo do que é feito aqui: já que não temos muito dinheiro, nosso argumento é quase sempre rico e inusitado. A gente ganha pelo texto, pelos atores…

Apesar de amar cinema minha visão não é técnica, confesso. Então minhas críticas são mais leves, talvez… Vamos ao filme…

Os pais, militantes do Partido Comunista em plenos anos 70, estão fugindo da Ditadura Militar e deixam o filho na casa do avô que morre. O restante do filme não vou contar para não perder a graça.

Só quero pontuar as dualidades culturais vividas pela criança. Ele fica num bairro em São Paulo que tem italianos e judeus. Tem até descendente de grego. É uma verdadeira mistura. Um Senhor judeu cuida do menino que tem uns doze a treze anos.

O menino, no futebol, vê alguém se benzendo para ter sorte no jogo e faz o mesmo. O judeu soca-lhe um tapa na cabeça.

A criança brinca de bola no corredor do prédio onde ficou, com um manto sagrado dos judeus. Isso lhe custa um tapa na cara.

Ele estranha o fato de ter de comer peixe de manhã, mas no finalzinho do filme ele serve a um visitante peixe afirmando que aquilo seja bom para a memória.

Ele visita tranqüilamente as cerimônias judias, sabe conviver em paz com os italianos. Não se irrita por ter que conviver com muitos idosos e nem se ressente das outras crianças que falam mal de seus pais.

Ele apenas vive. E aquilo é muito bonito. Não argumenta, não questiona, não está certo sobre nada, não tenta convencer ninguém. Não tem teses. Não é excessivamente nada, além de torcedor do Brasil, que vai ao México lutar pela Copa do Mundo em 1970.

Ele é só uma vida. Só uma beleza. Apenas um olhar ingênuo de criança que cativa a todos.

Apenas não entende porque seus pais se demoram tanto de voltar e passa o filme todo na expectativa de revê-los. Sua necessidade passa apenas por amar. Esse ponto, no filme, é sofrido, embora a gente sinta a leveza infantil de sobreviver.

Não estou fazendo apologia à ingenuidade de quem tudo aceita, mas bem que a gente poderia ser mais leve, menos ‘reclamante’, menos nossas próprias certezas, mais vida.

Vale a pena vê-lo. É isso que sempre escrevo quando vejo algo que, de alguma forma, celebre a existência.

Educar para a paz…


Eles sempre chegam de mãos dadas aos ensaios do coro infanto-juvenil de lá da igreja. E têm apenas sete e oito anos. São crianças, portanto.

Todas as vezes que os vejo chegar, tão unidos, penso na importante tarefa de ser mãe.

Minha mãe também nos criou assim, Júnior e Gabi… Para a paz.

Se brigássemos, se a coisa fosse muito séria, como naquele dia em que eu provoquei um corte enorme na perna de Marquinhos, ela vinha, me reclamava, mas pedia que um abraçasse o outro. E disséssemos um ao outros que nos amávamos.

Confesso que eu morria de raiva de ter que abraçar Marcos enquanto queria mesmo era que ele sumisse de minha frente. Ele era intrigante e pirracento. Mainha nos obrigava ao abraço, ao perdão e à cultura da não-vingança.

Gabi e Júnior me fazem lembar como é importante viver junto, andar de mãos dadas, cuidar um do outro…

Esse é um dos mais importantes segredos da vida, para mim.

foto: Ieda e Neto.

Uma pergunta à mídia brasileira

É impressionante a ação da mídia frente aos fatos que ocorrem no nosso cotidiano.

Já falamos aqui sobre os aparelhos ideológicos, como eles atuam em nosso jeito de ser, pensar e agir. Não quero me aprofundar nessas questões nem falar mais do que já falo contra essa forma perversa de tratar nossas causas, a vida, os acontecimentos.

Só quero fazer uma pergunta hoje: por que é que no caso (comovente, sim!) de Isabela todos os repórteres ficam como urubus em cima da família, do casal suspeito, dos vizinhos? Ninguém tem paz desde que ocorreu o acidente com a menina em São Paulo. Não se fala em outro assunto na mídia.

E por que é que, no também comovente caso da menina Mariana, em Planalto, no interior da Bahia, nem se toca no assunto? Será porque pelo fato desta segunda ter nascido num lugar muito pobre no interior da Bahia, ser filha de pobres e não possuir piscina nem elevador em sua casa, seu caso não seja digno de ‘holofotes’?

Eu não entendo.