IMPORTÂNCIA DA VIDA E DA OBRA DE FREUD…

Após devida autorização verbal, tenho a honra de postar o texto abaixo que é de um dos mais competentes e estudiosos Psicanalistas Clínicas daqui de Jequié.
Todas as quartas-feiras, há muito tempo, nos encontramos, juntos com outros Psicanalistas para estudarmos questões ligadas à Psicanálise Clínica. Passamos por vários autores, terminamos fazendo análise de grupo e é, realmente, para mim, uma grande experiência poder estar acompanhada de tão boa gente.
Djalma tem um arcabouço bibliotecário invejável. É um leitor compulsivo (isso também é uma questão pscanalítica. Rs).
Gosto de suas provocações. Gosto de seu pensamento crítico, embora discorde dele em vários aspectos. No fundo, nós nos admiramos, eu sei.
Então, abaixo, o texto do meu amigo. Sempre falo que ele me enriquece com bens teóricos. Espero que todos gostem.

IMPORTÂNCIA DA VIDA E DA OBRA DE FREUD NA PSICANÁLISE
E SUA MANIFESTAÇÃO NA ATUALIDADE
Por Dijalma Galvão Oliveira
A história do homem é marcada por grandes descobertas. A teoria daevolução das espécies, de Charles Darwin, os estudos de Isaac Newton sobre a gravidade, a física quântica atual e tantos outros que poderíamos relatar. Todas elas causaram grande impacto no desenvolvimento da humanidade. Entretanto, nenhuma se compara ao feitode Sigmund Freud. Uma viagem ao interior do ser humano. A descobertado inconsciente e suas implicações na patologia da vida mental.
Sigmund Freud (Sigismund Schlomo Freud até os 21 anos) nasceu a 6 de maio de 1856 em Freiberg, Moravia, no império austro-húngaro (hoje Pribor, Checoslováquia). Filho de Jacob Freud, um comerciante judeu, e de sua jovem segunda esposa Amália Nathanson, Freud tinha irmãos do primeiro casamento do pai com Sally Kanner, falecida em 1852, que eram cerca de vinte anos mais velhos que ele. Em 1860, devido à falência donegócio do pai, sua família mudou-se para Viena; Freud tinha 4 anos.
Aos nove anos Freud entrou para a escola onde teve um aproveitamento acima da média. Para sua formação superior, matriculou-se na Universidade de Viena em 1873.
A relação de Freud com a “futura” psicanálise deu-se a partir do acompanhamento de uma paciente do Dr. Josef Breuer, conhecida clinicamente por Anna O. Tratava-se de uma jovem de vinte e um anos, com sérios problemas de histeria e que era tratada com métodos de hipnose. Fascinado pelos resultados obtidos pelo Dr. Josef Breuer com essa técnica, Freud decide dedicar-se ao assunto e muda-se para Paris onde vai trabalhar com um renomado médico, especialista no método da hipnose, chamado Dr. Jean-Martin Charcot. Em pouco tempo Freud percebeu que a técnica da hipnose poderia ser substituída pela conversa com o paciente.
Substituindo definitivamente a hipnose pela conversação, Freud passou a utilizar o divã para colocar seus pacientes em uma posição de conforto e através da livre associação de idéias levava-os ao encontro de seus traumas fazendo-os conscientes dos motivos de seus problemas.
Essa nova técnica possibilitou a Freud descobrir que a mente humana não trabalha apenas com a consciência. Existem fatos que, por motivos diversos, são “guardados” fora da consciência. Ou seja, estão em um estado inconsciente.
Mas nós chegamos ao termo ou conceito de inconsciente ao longo de outro caminho, pela consideração de certas experiências em que a dinâmica mental desempenha um papel. Descobrimos – isto é, fomos obrigados a presumir – que existem idéias ou processos mentais muito poderosos (e aqui um fator quantitativo ou econômico entra em questão pela primeira vez) que podem produzir na vida mental todos os efeitos que as idéias comuns produzem (inclusive certos efeitos que podem, por sua vez, tornar-se conscientes como idéias), embora eles próprios nãose tornem conscientes (FREUD, 1997, p.12).

As experiências vivenciadas pelos seus pacientes levaram Freud a desenvolver estudos sobre a sexualidade e determinar a sua importância na construção de diversos traumas e neuroses. Deparando-se com o fato inarredável da universalidade das chamadas perversões sexuais em seus pacientes, Freud conclui que a sexualidade humana apresenta uma verdadeira “constituição sexual” que assume o lugar de uma “disposição neuropática geral”, formulação através da qual ele torna inexistente a fronteira entre o normal e o patológico (JORGE, 2005, p.21).

Devido ao tabu que significava o sexo àquela época, Freud sofreu a ira e a humilhação de seus pares ao apresentar suas teorias relacionadas aos desejos sexuais durante um congresso médico. Dado a ineditismos, Freud passou a analisar seus próprios sonhos e como resultado escreveu uma das suas mais importantes obras, a Interpretação dos sonhos.
Considerado pelo próprio Freud um livro de “leitura difícil”, A interpretação dos sonhos (1900) é um trabalho cuja extensão requer grande fôlego para ser abordado. Nele, Freud introduz uma enorme massa de elementos novos, que lhe era exigida para formular sua primeira teoria do inconsciente num grau de abrangência que expunha a congruência existente entre uma função comum a todo sujeito – o sonho – e os mecanismos encontrados pela psicanálise na estrutura neurótica (JORGE, 2005, p.125).

No ano de 1908, Freud, juntamente com outros médicos interessados na teoria psicanalítica, entre eles Carl Gustav Jung, fundaram a Sociedade psicanalítica de Viena, a qual, dois anos depois, se tornaria a Associação Internacional de Psicanálise.
Desde a publicação, em 1895 do texto Estudos sobre a histeria, onde Freud e Breuer discutiam o caso de Ana O, até os dias de hoje a psicanálise, assim como as outras ciências, tem acompanhado a evolução do homem e se adaptado para atender as novas necessidades que dela são exigidas. Essa nova conjuntura trouxe, e não poderia ser de outra forma, várias correntes de pensamento onde as idéias de Freud são mantidas e defendidas por umas e criticadas e consideradas ultrapassadas por outras.

É desnecessário dizer que descobertas e preferências teóricas diferentes desenvolveram-se em diversas partes do mundo. A evolução da psicanálise na América do Norte seguiu várias trajetórias distintas.
Enquanto para alguns psicanalistas a teoria das relações objetais substituiu a psicologia do ego de Freud, outros psicanalistas mantêm um comprometimento com as teorias inicias de Freud e com teorias mais contemporâneas – uma tendência a fim da teoria das pulsões em conjunção com a teoria das relações objetais. Entretanto, alguns psicanalistas ainda seguem quase que inteiramente a teoria das pulsões, ao passo que outros aderem quase exclusivamente à teoria das
relações objetais. No presente momento, os psicanalistas do mundo inteiro não estão unificados em uma única visão da vida mental. O “pluralismo teórico” domina a cena psicanalítica (ETHEL, 2007, p.15).

O pluralismo teórico a que Ethel faz referência é importante e necessário ao processo de desenvolvimento humano. É no campo das idéias que se constrói no presente, baseado no passado e com a visão no futuro. O fato é que o trabalho de Freud em desvendar as áreas
obscuras da mente humana possibilitou conhecer melhor o homem, entender suas fraquezas e melhorar a qualidade de vida das pessoas. Por mais que se discuta se as teorias freudianas estão ou não corretas, não vai mudar o fato de que elas deram um passo enorme na construção do imaginário humano ideal.

REFERÊNCIAS
FREUD, Sigmund. O ego e o id. Trad. José Otávio de Aguiar Abreu. Rio de Janeiro: Imago, 1997.
JORGE, Marco Antonio Coutinho. Fundamentos da psicanálise de Freud a Lacan, v.1: as bases conceituais. 4ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.
NASIO, J. –D. Lições sobre os sete conceitos cruciais da psicanálise. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.
NASIO, Juan-David. Como trabalha um psicanalista? Trad. Lucy Magalhães. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.
PERSON, Ethel S. Compêndio de psicanálise [organizadores] Ethel S. Person, Arnold M. Cooper e Glen O. Gabbard. Trad. Daniel Bueno. Porto Alegre: Artmed, 2007.
http://www.cobra.pages.nom.br/ecp-freud.html. Acessado às 22:21 horas do dia 24.06.2007.

LONGE DE CASA…

Seu desejo era apenas um: voltar para casa. Mas a cada tentativa, depois da guerra entre a Grécia e Tróia, algum detalhe, algum pequeno erro, qualquer vacilo de seus marinheiros, fazia o caminho impeditivo: chegar em casa, ver sua mulher e seu filho era tarefa insistentemente perseguida para Ulisses, segundo a lenda de Homero.

Para o filho pródigo, narrado na Escritura, não foi tão difícil. No momento em que o moço caiu em si, pode baixar a guarda e afirmar: vou voltar e pedir a meu pai que me deixe viver como vivem seus empregados. E foi festa, foi anel no dedo, roupas novas, vinho novo. Ao ponto de incitar ciúmes no irmão mais velho que, irado por ver o vulto de seu retorno, contundiu com o pai sobre o porque de tanto amor a alguém que não o merecia.

Alguns pacientes em Psicanálise estão assim: hora são dependentes de seus pais. Outra, da namoradinha. Depois, dependem de status. Em seguida, viciam-se por drogas. Por bebidas. Por dinheiro. Vícios que, na realidade são substituídos pelo apropriado e difícil caminho do auto-conhecimento.

Voltar para casa, do ponto de vista psicológico, está ligado a voltar para si mesmo. Voltar-se para seu próprio eu, que deverá e poderá ser fortalecido pela reconstrução de sua própria história, pela re-elaboração de sua auto-estima, pela descoberta do valor da sua vida – ainda que a seus próprios olhos sua vida não tenha sido e nem seja das melhores.

O primeiro passo para o auto-conhecimento seria o retorno a si mesmo. É dar um passo aquém de mim. É rever meus princípios, meus valores. Perceber em que posso produzir, valorar minha vida. Quanto de lição, de amor, bondade, alegria vivi. Qual sentido dei e dou à minha existência. O segundo passo seria traçado a partir do outro. Do não-eu. Do sujeito social que há além de mim. Que é construído, sim, por mim, mas tendo como ponto de partida o meu par. O outro que não sou eu. E isso está além de mim.

No caso de Ulisses, qualquer vacilo cometido significaria mais algumas milhas para o retorno à sua casa. Mas Ulisses não perdia as esperanças, o rumo. Ele queria mais do que tudo, cumprir seu desejo de chegar. Retornar para casa movia sua vida, dava-lhe coragem e forças para enfrentar monstros, mares, tempestades, medos, poderes. Ele não se deixava abater. Esta é uma grande lição. Não desistir nunca de seus sonhos é um tema que já virou lugar comum na saga humana.

O filho pródigo quis retornar ao Pai. Esse movimento que toca o espiritual e está distante desse emaranhado religioso que tem parecido moda no Brasil. Retornar ao Pai foi, para o filho pródigo, um grande retorno às suas raízes, à sua identidade. Voltar é sempre bom quando se está sendo esperado e, de fato, o melhor momento da viagem é o retorno para casa.

O caminho do auto-conhecimento não é algo fácil. Não mesmo. Dói, dói muito. Fere, machuca. Todavia é uma odisséia para a qual todo homem e toda mulher deveria estar motivado a fim de resgatar sua história, ressignificar suas origens, seus revezes. Dar novo fôlego à sua existência, re-elaborar sua dor e construir, a partir de tudo isso, sua realização pessoal ou um forte motivo para seguir adiante. Já dizia o poeta que navegar é preciso. Sim, meu caro. Viver também o é.

Que haja alegria em nossos horizontes. Esperança em nossos passos e vontade de chegar em casa. Acima de tudo, coragem de chegar em si, no seu canto existencial, assumindo-se como gente, como ser humano.

Homero nos deixa a lição da coragem e da perseverança para seguirmos nosso caminho. Provavelmente Ulisses não pode desfrutar dos braços ternos, belos e dóceis de sua amada. Mas Ulisses seguiu adiante, perdendo homens, vivenciando horrores. O medo de cada esperiência não foi maior que a insistente e teimosa vontade de se realizar como homem, acima do herói.

O filho pródigo nos ensina o poder da humildade. Sua consciência de que viver entre porcos não era algo para ele o levou a pedir desculpas e retornar para casa. Se voltar para casa é algo maravilhoso, imagine para alguém que já nem tinha esperanças de que isso seria possível algum dia?


Nos dois casos, a consciência de que era necessário retornar justificava vencer qualquer obstáculo. Nada era motivo de desistir do calor paterno (para o Filho pródigo), dos braços da mulher amada e do sorriso do filho (Para Ulisses). Ter a consciência fortalecida é tarefa primordial em Psicanálise. Esse caminho nos leva de volta para casa. Nos acalenta e alma e dá saúde ao corpo.

Mamãe, eu quero mamar.


“Mamãe, eu quero mamar.”

Quase sempre as reuniões sociais são acompanhadas de lanches, almoços, jantares, festas. Hoje, em qualquer curso, encontro, há a “parada para o café”, o famoso Coffee Break. Onde há gente, há comida. Às vezes, muita. Outras, nem tanto. Até em velórios podem ser encontrados chás, cafés, biscoitos.

O fato é que comer está ligado à nossa vida de uma forma intrínseca. Come-se para saciar-se. Come-se para festejar. Come-se para alimentar-se – pode parecer redundante, mas há gente que come por comer; apenas para satisfazer sua propensão, sua obsessão mesmo por ter o prazer de comer e comer muito. Aí, mora um grande perigo de que falaremos abaixo.

Logo que a criança nasce, de um modo geral, ela tem o seio da mãe. Essa relação tende a ser íntima, significativa, intensa. O perfeito retrato do bem-estar, da serenidade e do afeto. Esse momento registra significados psicológicos que estão além do ato de alimentar. Sugar está ligado a imaginar. Comer, então, se torna troca, comunicação. O ato de nutrir se transforma em relação mãe-filho. Ao amamentar, a mãe doa a criança algo mais que seu próprio leite. Ela transfere segurança e possibilita, ao pequeno, desenvolvimento e estruturação de sua personalidade porque o mundo entra pela boca do bebê, assim como a presença ou a falta de afeto é percebida já nesse momento.

Ao mamar, a criança introjeta, além do alimento, os sons do ambiente; a segurança ou a insegurança da mãe; o afeto oferecido ou negado. Desenvolve também o poder de concentração, especialmente se a mãe é atenciosa e separa aquele momento de amamentar apenas para ter o contato especial entre ela e o filhote, com troca de olhares, toque, afeto, amor. Esse momento terminará por definir a estruturação psíquica da criança. Comer é sentir prazer. Não à toa a criança pára de chorar quando mama.

Os hábitos alimentares são aprendidos em casa, logo nos primeiros dias de vida. Os sabores consumidos pela mãe são facilmente apreendidos pelas crianças que comumente, ao crescerem mais um pouco, vão aceitar outros tipos de alimento. Ou seja: a criança certamente comerá o que a mãe comia no período da amamentação. Quanto mais rica for a dieta alimentar da mamãe, maior será a facilidade de levar seu filho a comer devidamente. Isso é importante nesses tempos em que os alimentos industrializados, os biscoitos empobrecidos em nutrientes e os refrigerantes, dentre outros, estão tão na moda.

O outro ponto está ligado ao que se come em casa. Mães e pais que reclamam de seus filhos não desejarem comer frutas ou verduras, ou alimentos de rica nutrição, quase sempre também não são adeptos a comerem esses mesmos alimentos. É o famoso “faça e que mando mas não faça o que eu faço”. O pequeno aprende a comer o que vê o adulto comendo.

Se você quer que seu filho coma tomate, apenas você mesmo coma tomate. Ele vai ver, vai aprender a desejar e logo estará comendo, sem ninguém precisar insistir. Alimentar-se é uma experiência cultural e social. Aprendo a comer vendo o outro, especialmente se este outro é quem amo, comendo. Mães, pais, cuidadores possuem a capacidade de orientar a escolha alimentar feita pelos filhos. Além disso, é importante ter os pequenos à mesa, enquanto comemos. Eles aprenderão.

Quanto à obsessão por comida, acima mencionada, é outro caso que preocupa a estudiosos, médicos, à família e ao próprio envolvido no assunto. Isso porque ninguém quer saber de ser gordo. Ser obsessivo por comida acarreta tristeza, infelicidade, culpa, baixa auto-estima e arrependimento. A pessoa sabe que sua relação com comida não é saudável e paga sérias conseqüências por isso.

Comer bem e na quantidade ideal revela uma maneira amadurecida psiquicamente de relacionar-se com a comida e, além disso, consigo mesmo. Isso porque comer é expressão da boa relação com o seu próprio corpo e com os outros. Se comer é a primeira interação da pessoa com o mundo, qualquer relação anormal ou obsessiva com essa interação pode revelar séria ausência de afeto, de carinho. Esse fator pode desencadear sérias consequências para a saúde emocional da pessoa.

Na boa relação com a comida, a gente revela traços de estabilidade emocional, de amor próprio, de auto-conhecimento. É nessa interação que o obsessivo busca preencher o ‘buraco-negro’, a lacuna existencial, o prazer não encontrado, negado, reprimido. A ausência, a perda, o sentimento de desprazer. Eu como para diminuir meu desprazer, tenho uma compensação imediata. Depois, com o estômago inflado e estufado eu me arrependo de ter comido tanto. Ou seja: o prazer foi profundamente efêmero, passageiro. “Eu preciso de ajuda”.

Envelhecer

A Ciência afirma que quanto mais jovens forem as células de nosso corpo, mais capacidade elas possuirão para se reproduzirem. Ora, se as células cancerosas também possuem alto poder de reprodução, pela metástase, o envelhecimento das células seria, então, uma forma de não se auto-reproduzirem, de não se auto-destruírem, ou seja, de não morrerem. Para facilitar ainda mais nosso raciocínio, podemos afirmar que envelhecemos, no nível celular, para não morrermos. Que bom!

Envelhecer, portanto, tem a ver com a possibilidade de estar vivo e com saúde. Envelhecer é algo sublime. É saber-se vivo, podendo olhar para trás e perceber quantas experiências foram vividas, quantas aprendizagens internalizadas, quanto você conseguiu produzir, qual o patrimônio cultural que foi construído pela sua família, pelo seu grupo de amigos, pela vida social que você desenvolveu ao longo do tempo. Além de olhar para trás, é o momento de ir adiante, de ter sonhos, de fazer planos, de recomeçar a vida, quem sabe?

Estudos da Organização Mundial da Saúde (OMS) já indicam que o Brasil é um futuro país de idosos. Em todo o canto já se vê clínicas para a idade da experiência, casas de tratamento, asilos de luxo (ou não) e até casas de show e eventos voltados para a Feliz Idade. Isso, nas grandes capitais. Nos interiores também, aqui ou ali, já se despontam ações, grupos, eventos, produtos apropriados para que essa fase da vida seja um momento cheio de comodidade, saúde e conforto.

Há também o outro lado da moeda, que não é tão feliz. A idade pode acarretar limitações no corpo, convívio deficitário com a família, dependência financeira. Além da infeliz compreensão por parte da maioria da pessoas (por puro preconceito) de que o idoso não tem voz nem vez. Apesar do tão conhecido Estatuto do Idoso que lhe dá direitos, a importância, de fato, desse sujeito que pertence às nossas famílias não é, quase sempre, reconhecida. Esse fator produz prejuízos à nossa sociedade, tristeza e até depressão aos nossos velhos.

Vale a pena lembrar que a criança, ao nascer, já está envelhecendo. Não há uma idade definida para começar a envelhecer. O Estatuto do Idoso sinaliza a Terceira Idade a partir dos 60 anos, mas a gente, todos os dias, vai mudando a pele, os cabelos, o corpo. Muito rapidamente as alterações físicas vão aparecendo e, ao menos que você morra, os dias, através do tempo, vão citando sua sentença inevitável: nós todos, vivos, estamos envelhecendo.

Se confunde velhice com morte. Morte é o fim da vida. A velhice, não. O idoso que sabe viver, normalmente, percebe quanto é bom estar vivo, quanto vivo ele está. Ele conecta bem sua história de vida, resgata as boas experiências, identifica o que foi bom, elabora o que não foi tão bom. Reedita alegrias, relembra o passado mas segue adiante para um futuro cheio de sonhos e planos. Enquanto há vida, para o sábio idoso, há esperança. Há alegria. Há sonhos, Há vida! E quanta sabedoria a gente pode encontrar na fala dos nossos queridos avós, tios, conhecidos…

Eu não sou totalmente contra plásticas, cuidados com o corpo, vaidade. O que não entendo, embora respeite a opinião de quem o faz, é a luta por não envelhecer. É o pavor da idade. A negação de que os dias se passaram e hoje tenho mais rugas do que ontem. É o pensamento de que ser belo é incompatível com ser idoso.

É possível, sim, ter vida de qualidade na idade. É possível se cuidar desde já com atividades físicas, com vida social ativa e saudável, com alimentação cuidadosa. Quanto for possível. Mas ainda insisto que a qualidade de vida na Terceira Idade está muito ligada à decisão do idoso de manter seus planos e sonhos, de desejar viver bem e fazer isso se tornar um fato com decisões inteligentes e apropriadas. Embora para a maioria dos idosos não seja muito fácil, é possível, sim, viver bem, com a idade que se tem.

Dorme, dorme, Delecher…

Dorme, dorme, Delechér…

Já se observou que as músicas brasileiras para ninar bebês estão carregadas de conteúdos que estimulam a timidez, o medo, a insegurança.

Não à toa as pessoas tem insônia, dificuldade para dormir. Letras como: “dorme, neném, que a Cuca vai pegar” faz a criança pensar que se não dormir logo será ameaçada por aquele personagem horrível e amedrontador do Monteiro Lobato. Outra musiquinha também curiosa é: “boi, boi, boi, boi da cara preta, vem pegar fulano que tem medo de careta.” As melodias são realmente calmantes, belas, harmoniosas. Mas a mensagem da letra não é das melhoras se a gente quer que a criança dorma um sono tranquilo, sem pesadelos, sem medo.

Há crianças que dormem com os pais. Nada melhor para expressar amor dos pais, já que é a noite que eles estão descansados, na cama quentinha, desfrutando do amor, do abraço e do aconchego paterno. Certo? Não exatamente. Isso porque os pais acabam permitindo que os pequenos durmam no mesmo quarto deles toda a noite, incluindo a presença na hora do ‘namoro’. Os pais pensam: “mas nossos filhos estão dormindo, não vão ver o ato sexual!” Mais um engano. Os filhos ficam normalmente à espreita, fingindo dormirem. Em sua remota formação psíquica os pequenos entendem que os gemidos da mãe são de dor e que o pai está machucando a mãe. Sendo assim, a criança conclui: “vou ficar acordada para tentar impedir meu pai de machucar minha mãe.”

Esse momento define, dentre outros fatores, que aquela criança poderá ter insônia o resto da vida, sem saber o porquê. Vale relembrar que o inconsciente registra esses momentos para sempre e que a insônia voluntária pode resultar em involuntária. Ou seja: você até tenta dormir, mas não consegue.

Em outras palavras, nós geralmente criamos nossos filhos dando-lhes tudo de bom, todo nosso cuidado, nosso amor, aconchego. Isso, de modo geral, é um fato. Nos esforçamos para que nossa prole tenha estabilidade emocional, sucesso profissional e pessoal. Que tenha uma bonita história de vida. Quem não quer ver sua própria cria tendo êxito em todos os aspectos existenciais? O problema é que, desavisados, cometemos equívocos que comprometerão o futuro mentalmente saudável dos pequenos.

Dormir, para muitos, não é uma fácil tarefa. Por isso a industria farmacêutica tem crescido nos últimos tempos, nos entupindo de remédios, relaxantes, anti-depressivos. São os psicofármacos tão conhecidos por esse século que embora já consiga tirar fotografias de alta resolução em Marte, ainda não conseguiu reconciliar-se com seu próprio sono. Com o seu próprio eu. O sono artificial não se aproxima do sono natural, tanto quanto uma boa dentadura não se iguala aos nossos dentes próprios.

O sono está além do conceito de descanso ou de servir simplesmente para repor as energias gastas durante o dia. O sono vale para a preservação da saúde. É o momento da reorganização da mente. Isso porque um sono tranquilo, noturno e reparador fortalece as defesas do organismo que, além de outros benefícios, facilitará a aprendizagem e a criatividade. Costumo dizer que o sono é nosso espaço íntimo de encontro conosco mesmo. É o lugar onde nossas fantasias ocorrem, alimentando nossa capacidade de ter melhor qualidade de vida, de resolução dos nossos íntimos desejos, gerador de saúde mental. Isso equivale a dizer que dormir não é perda de tempo. Definitivamente, não.

E agora? O que faço para melhorar meu sono? O autor Weisinger, em seu livro Inteligência Emocional no Trabalho nos dá algumas dicas sobre diminuir o nível de excitação. E quanto mais excitado estiver seu corpo e sua mente, mais dificuldade você terá para dormir. Ele nos convida a evocar boas e prazerosas imagens; a condicionar-se a relaxar. Isso pode parecer difícil, mas é possível melhorar o nível de respiração, tentar relaxar o corpo. D. Branca, uma velha amiga nossa, diz sempre que problemas não se leva para a cama. Dizem os antigos que um velho e bom chazinho de camomila, de erva-cidreira, de capim santo, também resolvem. Vale a pena cuidar da higiene do sono, evitando atividades físicas duas horas antes de dormir, já diziam os Psiquiatras. O pensamento de que amanhã será outro e novo dia, cheio de novas expectativas e possibilidades também pode ajudar.

Dormir, para nossa saúde mental, deve ser tão importante e privilegiado por nós quanto o alimento diário, beber água, exercitar-se, ter pessoas que amamos por perto etc. Dormir precisa ser um ítem indispensável em nossa agenda. Inadiável. Para nosso próprio bem, para o bem daqueles que passam por nós. Isso sem falar na importância dos sonhos, dos quais falaremos em outra oportunidade.

Por outro lado, há pessoas que dormem demais. O sono patológico deverá ser investigado também por profissional competente. Dormir demais pode ser indício de depressão, de alguma irregularidade na saúde.

De qualquer forma, ainda reverbera em nossa mente infantil aquelas ameaças de que vamos ser devorados pela Cuca ou pelo boi-da-cara-preta. A noite, para muitos, ainda é sinônimo de tristeza, de angústia, de insegurança. Alguém poderia responder o porquê? Drummond vem a nosso socorro pontuado que “No meio do caminho tinha uma pedra.”

Vai ver que nas saudosas cantigas da roça estejam um importante princípio da sabedoria paterna: “Dorme! dorme! Delechér, dorme, dorme! Delechér não quer dormir? Dorme, dorme.” Simples assim: sem ameaças, sem afrontas, oferecendo à criança o maior conforto emocional, amparo do bom, seguro de inesquecível colinho de mãe ou de pai. Ou de quem de verdade ama.

Alguns aspectos sobre a Pedofilia


Dentre tantos assuntos que estão em evidência nos últimos tempos como a violência, as drogas, as psicoses, os desequilíbrios emocionais, poucos provocam tanto estranhamento e medo quanto à Pedofilia. Para agravar ainda mais a situação, esse evento é mais comum na nossa sociedade atual do que se pode imaginar e quando menos se espera, pode se manifestar muito perto de nós, de nossos conhecidos, vizinhos, familiares.

Este texto pretende trazer luz à algumas questões sobre o assunto para que haja clareza na compreensão dos fatos, para que famílias não sejam desestruturadas e que haja tolerância, diálogo e maturidade para enfrentar a questão de frente, sem artifícios que além de não resolverem o problema acabam por maximizar ainda mais os traumas de todos os envolvidos no caso que porventura vier à tona.

Há pelo menos quatro fatores que precisam ser levados em conta quando surge algum caso de Pedofilia.

1. A criança – A menina ou o menino que sofreu a agressão não é culpada/o e muito menos provocou o ato pedofílico. Primeiro porque embora as crianças tenham sexualidade e libido – conforme nos esclarece Sigmund Freud em Três Ensaios sobre a Sexualidade – elas não estarão psíquica nem biologicamente prontas para compreender toda a complexidade do sexo. Depois disso, consforme orienta o Estatuto da Criança e do Adolescente, criança precisa ser protegida, não acusada. Em outras palavras, criança abusada sexualmente é vítima, não culpada. Ela poderá até ser despertada de forma precoce para o sexo, mas continuará se sentindo indefesa e terá de enfrentar medo e insegurança para o resto da vida, caso não re-elabore ou ressignifique a agressão. Vale ressaltar também que o pedófilo, de um modo geral, a ameaça fortemente se ela vier a contar a algum adulto (à mãe, ao pai, à família) o que vem sofrendo/vivenciando.

2. A vítima de pedofilia e sua vida futura – Cada pessoa tem sua sensibilidade própria, seu jeito de viver a vida e de exercer seu papel social em sua história pessoal. Há pessoas que sofreram agressões sexuais na infância e tiveram sua sexualidade exageradamente explorada levando para seu futuro pesadas cargas de experiências sexuais que tanto podem favorecer-lhe ou não em sua vida futura. Depende de cada caso. Há outras, conforme a sua fragilidade, que desenvolvem verdadeira ojeriza sobre sexo e tem sua sexualidade comprometida. Outras adquirem aversão ao sexo oposto. Só para citar algumas das muitas consequencias que podem advir dessa tão séria experiência do sexo na infância. Como já foi anteriormente sinalizado, também a vítima pode – mas isso não é regra geral – se tornar um futuro pedófilo, tendo em vista que, em sua estrutura mental, ele pode criar a idéia distorcida de que “se fizeram comigo, vou fazer com outra criança, para me vingar.” Ou mesmo desenvolver a idéia de que só terá prazer sexual se se relacinar intimamente com alguma criança. Esse fato será melhor explanado logo abaixo.

3. O Pedófilo – Por outro lado, o pedófilo, embora cometa crime, tambem precisa ser reconhecido como um ser humano e, por ser gente, necessita ser ouvido e tratado clinicamente em suas dificuldades. Ninguém cresce planejando ser pedófilo para fazer pessoas sofrerem. O pedófilo, comumente visto como monstro, possui uma história de vida própria, tem suas limitações e sofrimentos e quase sempre é alguém que também foi vítima na infância, de violência sexual, de abusos, violações. Pode-se afirmar, então, que embora seja revoltante sua ação, posto que não se deve machucar ou abusar de crianças, é cabível promover saúde mental e até cura a pessoas com tal tipo de parafilia. Outra informação que se deve levar em conta sobre o pedófilo é que ele, por sua formação psicológica minada por insegurança, considera que só poderá ter prazer se se relacionar com crianças, posto que elas não terão como se defender e também seriam supostamente tão inseguras quanto o próprio agressor.

4. A família – Quando se fala de Pedofilia as famílias se contorcem, se arrepiam, sentem nojo e repulsa. É natural que seja assim, pois é realmente um tema difícil de ser trabalhado, compreendido e até mesmo aceito. A saída para a família acometida por tão grave incidente seria encarar a questão com maturidade, com clareza e buscar atendimento profissional para todos os envolvidos, em especial para a criança e, se for possível, para o próprio agressor. Isso por que, infelizmente, na maioria dos casos, as estatísticas demonstram que os agressores são componentes da própria família, como os pais, os avós, os tios, os padrastos. Mulheres, também, podem efetuar práticas desse tipo. O que pouco se fala é que, ingenuamente, pais muito carinhosos, que acariciam genitálias dos filhos, no banho, na cama, podem estar, mesmo sem querer, despertando sexualmente os seus pequeninos e afetarem, para sempre, sua sexualidade.

Todos os envolvidos em casos de Pedofilia sofrem vergonha, dor, revolta, medo, insegurança. Até mesmo o pedófilo, na maioria dos casos, passa por fortes crises emocionais e existenciais. É necessário bastante cuidado, clareza e maturidade para enfrentar o problema, coragem para buscar ajuda profissional e sabedoria para evitar que estragos maiores ocorram com os envolvidos, provocados pela inapetência em tratar questão tão delicada.

Referências:

 FREUD, S. – Três Ensaios Sobre Sexualidade, 1905
 Estatuto da Criança e do Adolescente. Brasil. Estatuto da criança e do adolescente (1990). Lei n. 8.069, de 13 de julho de 1990

Dar um passo além de si mesmo

Nem sei se ainda sei blogar… Faz tanto tempo…

Desde que comecei o curso de Psicanálise (pelo qual estou apaixonada!), parei de escrever por aqui.

Ainda estou fazendo o mergulho dentro de mim. Tenho descoberto coisas que me amedrontram e outras que me dão esperança e alegria. Acima de tudo, já sei que preciso me desprender, desconstruir de novo, dar passos maiores para fora e para dentro de mim mesma e crescer. Retroceder. Seguir. Criar coragem.

Essa viagem é sem fim e fantástica. Mas por ela você acaba encontrando pontos desagradáveis. O melhor de tudo, para mim, é poder verificar as possibilidades e os próprios limites. Assumir-se como gente além de apenas falar em humanidade.

Não tenho ainda certo sobre o que continuarei escrevendo ou se continuarei fazendo isso. Só adianto que o caminho que percorro é bastante interessante. A gente nunca sabe ao certo quais horizontes a gente guarda dentro de si nem quanta bagagem os nossos poucos anos de vida conseguem carregar. Descobrí-la, pois, é o trabalho do analista, junto com seu analisando. Na verdade, é o trabalho do analisando.

Saramago fala que “É necessário sair da ilha para ver a ilha. Não nos vemos se não saimos de nós”.

É isso.

Presença Paterna


A única coisa que me fazia ter coragem e voltar a dormir tranqüila nas noites de medo, quando eu era criança, era bater à porta do quarto de meus pais.

Mainha, sempre amorosa, ia abrir a porta com imensa boa vontade e nem precisava dizer-lhe nada: ela já sabia que eu queria amanhecer com eles. Entre eles.

Então eu me aproximava de papai que tinha uma barriga grande, esteticamente feia, mas emocionalmente perfeita para mim.

E eu ficava ao lado daquela barriga. Debaixo dela.

Eu era uma criança tão magrinha e pequena que ficava quase completamente protegida por aquele abdômen avantajado.

Ali, nem os monstros do Robô gigante, nem a Cuca, nem o Minotauro, nem o Bicho Manjaléu, nem os mortos, nem os sapos malvados ou qualquer outra criatura da escuridão poderia me ameaçar.

Papai era meu herói, meu ícone.

De alguma forma ainda o é.

Mesmo que não tenha mais aquela maravilhosa barrigona e eu tenha descoberto algumas falhas nele… E quem não as têm? (Descobri com o passar do tempo tantos defeitos em mim mesma!).

Em meus últimos (e parcos) estudos psicanalíticos tenho observado que algumas mulheres, senão a maioria, transferem para seus pares a idéia que tiveram de seus pais na infância.

A concepção de Deus também, para muita gente, passa por esse aspecto: a idéia que você tem de seu Deus será a mesma que tem de seu próprio pai.

Foto: Giulia e seu pai.