Convite à doce revolução

Artigo 1 – Fica decretado que agora não há mais nenhuma condenação para quem está em Jesus, pois, o Espírito da Vida em Cristo, livra o homem de toda culpa para sempre.

Artigo 2 – Fica decretado que todos os dias da semana, inclusive os Sábados e Domingos, carregam consigo o amanhecer do Dia Chamado Hoje, por isso qualquer homem terá sempre mais valor que as obrigações de qualquer religião.

Artigo 3 – Fica decretado que a partir deste momento haverá videiras, e que seus vinhos podem ser bebidos; olivais, e que com seus azeites todos podem ser ungidos; mangueiras e mangas de todos os tipos, e que com elas todo homem pode se lambuzar.

Parágrafo do Momento: Todas as flores serão de esperança; pois que todas as cores, inclusive o preto, serão cores de esperança ante o olhar de quem souber apreciar. Nenhuma cor simbolizará mais o bem ou o mal, mas apenas seu próprio tom, pois, o que daí passar estará sempre no olhar de quem vê.

Artigo 4 – Fica decretado que o homem não julgará mais o homem, e que cada um respeitará seu próximo como o Rio Negro respeita suas diferenças com o Solimões, visto que com ele se encontra para correrem juntos o mesmo curso até o encontro com o Mar.

Parágrafo que nada pára: O homem dará liberdade ao homem assim como a águia dá liberdade para seu filhote voar.

Artigo 5 – Fica decretado que os homens estão livres e que nunca mais nenhum homem será diferente de outro homem por causa de qualquer Causa. Todas as mordaças serão transformadas em ataduras para que sejam curadas as feridas provocadas pela tirania do silencio. A alegria do homem será o prazer de ser quem é para Aquele que o fez, e para todo aquele que encontre em seu caminhar.

Artigo 6 – Fica ordenado, por mais tempo que o tempo possa medir, que todos os povos da Terra serão um só povo, e que todos trarão as oferendas da Gratidão para a Praça da Nova Jerusalém.

Artigo 7 – Pelas virtudes da Cruz fica estabelecido que mesmo o mais injusto dos homens que se arrependa de seus maus caminhos, terá acesso a Arvore da Vida, por suas folhas será curado, e dela se alimentará por toda a eternidade.

Artigo 8 – Está decretado que pela força da Ressurreição nunca mais nenhum homem apresentará a Deus a culpa de outro homem, rogando com ódio as bênçãos da maldição. Pois todo escrito de dívidas que havia contra o homem foi rasgado, e assustados para sempre ficaram os acusadores da maldade.

Parágrafo único: Cada um aprenderá a cuidar em paz de seu próprio coração.

Artigo 9 – Fica permanentemente esclarecido, com a Luz do Sol da Justiça, que somente Deus sabe o que se passa na alma de um homem. Portanto, cada consciência saiba de si mesma diante de Deus, pois para sempre todas as coisas são lícitas, e a sabedoria será sempre saber o que convém.

Artigo 10 – Fica avisado ao mundo que os únicos trajes que vestem bem o homem diante de Deus não são feitos com pano, mas com Sangue; e que os que se vestem com as Roupas do Sangue estão cobertos mesmo quando andam nus.

Parágrafo certo: A única nudez que será castigada será a da presunção daquele que se pensa por si mesmo vestido.

Artigo 11 – Fica para sempre discernido como verdade que nada é belo sem amor, e que o olhar de quem não ama jamais enxergará qualquer beleza em nenhum lugar, nem mesmo no Paraíso ou no fundo do Mar.

Artigo 12 – Está permanentemente decretado o convívio entre todos os seres, por isso, nada é feio, nem mesmo fazer amizades com gorilas ou chamar de minha amiga a sucuri dos igapós. Até a “comigo ninguém pode” está liberta para ser somente a bela planta que é.

Parágrafo da vida: Uma única coisa está para sempre proibida: tentar ser quem não se é.

Artigo 13 – Fica ordenado que nunca mais se oferecerá nenhuma Graça em troca de nada, e que o dinheiro perderá qualquer importância nos cultos do homem. Os gasofilácios se transformarão em baús de boas recordações; e todo dinheiro em circulação será passado com tanta leveza e bondade que a mão esquerda não ficará sabendo o que a direita fez com ele.

Artigo 14 – Fica estabelecido que todo aquele que mentir em nome de Deus vomitará suas próprias mentiras, e delas se alimentará como o camelo, até que decida apenas glorificar a Deus com a verdade do coração.

Artigo 15 – Nunca mais ninguém usará a frase “Deus pensa”, pois, de uma vez e para sempre, está estabelecido que o homem não sabe o que Deus pensa.

Artigo 16 – Estabelecido está que a Palavra de Deus não pode ser nem comprada e nem vendida, pois cada um aprenderá que a Palavra é livre como o Vento e poderosa como o Mar.

Artigo 17 – Permite-se para sempre que onde quer que dois ou três invoquem o Nome em harmonia, nesse lugar nasça uma Catedral, mesmo que esteja coberta pelas folhas de um bananal.

Artigo 18 – Fica proibido o uso do Nome de Jesus por qualquer homem que o faça para exercer poder sobre seu próximo; e que melhor que a insinceridade é o silencio. Daqui para frente nenhum homem dirá “o Senhor me falou para dizer isto a ti”, pois, Deus mesmo falará à consciência de cada um. Todos os homens e mulheres que crêem serão iguais, e ninguém jamais demandará do próximo submissão, mas apenas reconhecerá o seu direito de livremente ser e amar.

Artigo 19 – Fica permitido o delírio dos profetas e todas as utopias estão agora instituídas como a mais pura realidade.

Artigo 20 – Amém!

Caio e tantos quantos creiam que uma revolução não precisa ser sem poesia.

Texto integral do Caio Fábio.

Não sou o único sonhador

Uma delícia esta máxima do John: “Imagine.”

Muito conhecida por praticamente todo o mundo.

Quem me conhece sabe que não sou muito dada ao idioma anglo-saxão. Mesmo assim, vale a pena escutar e pensar na letra de alguém que pretende, ainda que apenas por meio de uma poesia, viver outras e novas realidades, onde não haveria guerras ou desigualdades.

John experimenta uma certa idéia de utopia.

Eu também sou assim, John: acredito tanto que a gente podia ser diferente… mais humano, sei lá.

E vivo na luta. Quase sempre se trata de uma luta contra meu próprio orgulho e egoísmo.

Eu acredito que é assim e a partir das pequenas ações que a gente vai se humanizando.

Eu também sou uma sonhadora, John!

Imagine (John Lennon)

Imagine there’s no heaven,
It’s easy if you try,
No hell below us,
Above us only sky,
Imagine all the people
living for today…

Imagine there’s no countries,
It isnt hard to do,
Nothing to kill or die for,
No religion too,
Imagine all the people
living life in peace…

Imagine no possessions,
I wonder if you can,
No need for greed or hunger,
A brotherhood of men,
imagine all the people
Sharing all the world…

You may say I’m a dreamer,
but Im not the only one,
I hope some day you’ll join us,
And the world will live as one.

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Morrer é verbo intransitivo.

– Êda, desculpe-me a indiscrição, mas Sicrano morreu?
– Sim.
– De quê?
– Morreu apenas. Do quê não importa: morrer é verbo intransitivo. Quem morre morre e só.

Esta foi uma conversa que tive com uma de minhas melhores amigas há algum tempo.

Hoje, numa outra conversa, essa mesma amiga me perguntou sobre uma outra pessoa que havia falecido. Só que essa era praticamente de minha família.

Ao repetirmos o mesmo texto eu lhe perguntei: “Como assim, minha amiga? Intransitivo?

Ao que ela, como boa baiana que é, replicou:

– Oxe, menina! Mas foi você mesma que me ensinou! “Morrer é verbo intransitivo.”

Eu não me lembrava disso!

Quanto somos egoístas e insensíveis!

Quando a dor não é na nossa pele é como a ferida que a gente vê pela televisão: Longe, distante. Eu não sinto. Não é comigo.

Mas quando passa por minha casa, minha família, meus amigos, perto de mim…

Aí a gente fica sensível e compreende que regras da língua portuguesa ou quaisquer outras ficam à parte, longe de nossas considerações.

As imposições exteriores são frias e geralmente não passam por nossas emoções.

Palavras tomam novo sentido e cor quanto mais perto de mim estão.

O verbo é intransitivo, sim. Não mudou.

O que mudou foi o sentimento.

A dor agora é do lado de cá. Subjetiva.

E importa que seja compartilhada para não gerar maiores complicações.

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Presença Paterna


A única coisa que me fazia ter coragem e voltar a dormir tranqüila nas noites de medo, quando eu era criança, era bater à porta do quarto de meus pais.

Mainha, sempre amorosa, ia abrir a porta com imensa boa vontade e nem precisava dizer-lhe nada: ela já sabia que eu queria amanhecer com eles. Entre eles.

Então eu me aproximava de papai que tinha uma barriga grande, esteticamente feia, mas emocionalmente perfeita para mim.

E eu ficava ao lado daquela barriga. Debaixo dela.

Eu era uma criança tão magrinha e pequena que ficava quase completamente protegida por aquele abdômen avantajado.

Ali, nem os monstros do Robô gigante, nem a Cuca, nem o Minotauro, nem o Bicho Manjaléu, nem os mortos, nem os sapos malvados ou qualquer outra criatura da escuridão poderia me ameaçar.

Papai era meu herói, meu ícone.

De alguma forma ainda o é.

Mesmo que não tenha mais aquela maravilhosa barrigona e eu tenha descoberto algumas falhas nele… E quem não as têm? (Descobri com o passar do tempo tantos defeitos em mim mesma!).

Em meus últimos (e parcos) estudos psicanalíticos tenho observado que algumas mulheres, senão a maioria, transferem para seus pares a idéia que tiveram de seus pais na infância.

A concepção de Deus também, para muita gente, passa por esse aspecto: a idéia que você tem de seu Deus será a mesma que tem de seu próprio pai.

Foto: Giulia e seu pai.

O Tapeceiro


Tapeceiro, grande artista,
Vai fazendo seu trabalho
Incansável, paciente no seu tear

Tapeceiro, não se engana
Sabe o fim desde o começo,
Traça voltas, mil desvios sem perder o fio

Minha vida é obra de tapeçaria,
É tecida de cores alegres e vivas,
Que fazem contraste no meio das cores
Nubladas e tristes

Se você olha do avesso,
Nem imagina o desfecho
No fim das contas, tudo se explica,
Tudo se encaixa, tudo coopera pro meu bem

Quando se vê pelo lado certo,
Muda-se logo a expressão do rosto,
Obra de arte pra Honra e Glória do Tapeceiro

Quando se vê pelo lado certo,
Todas as cores da minha vida
Dignificam a Jesus Cristo, o Tapeceiro.


(Letra e Música: João Alexandre)

Mais uma vez o João me fascina.

Linda a música!

Vale a pena ouvir.

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Hoje: semente do amanhã


“Ontem um menino que brincava me falou
Que hoje é semente do amanhã
Para não ter medo que este tempo vai passar
Não se desespere não, nem pare de sonhar
Nunca se entregue, nasça sempre com as manhãs
Deixe a luz do sol brilhar no céu do seu olhar
Fé na vida, fé no homem, fé no que virá
Nós podemos tudo, nós podemos mais
Vamos lá fazer o que será.”

Este lindo texto do Gonzaguinha está em perfeita harmonia com o que Paulo, o apóstolo, sinaliza quando fala que o homem colhe o que planta.

A natureza é extremamente complexa e simples ao mesmo tempo.

Do ponto de vista biológico, científico, em relação às riquezas que nos proporciona, de um modo vasto, amplo, ela é cheia de particularidades e características que ainda são objeto de estudo nos centros acadêmicos e fomenta a nossa curiosidade.

No aspecto das lições que nos dá, e são muitas, a natureza é muito simples.

Qualquer criança pode ver e sentir. Descobrir.

A gente vai ter amanhã o que semeou hoje.

Por isso as decisões são tão importantes.

E a leveza e o amor devem estar perto de minhas preferências, sempre.

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Igual – Desigual

IGUAL – DESIGUAL

(Carlos Drummond de Andrade)

Eu desconfiava:
Todas as histórias em quadrinhos são iguais.
Todos os filmes norte-americanos são iguais.
Todos os filmes de todos os países são iguais.
Todos os best-sellers são iguais.
Todos os campeonatos nacionais e internacionais de futebol são iguais.
Todas as mulheres que andam na moda são iguais.
Todos os partidos políticos são iguais.
Todas as experiências de sexo são iguais.
Todos os poemas em verso livre são enfadonhamente iguais.
Todas as guerras do mundo são iguais.
Todas as fomes são iguais.
Todos os amores iguais, iguais, iguais.
Iguais os rompimentos.
A morte é igualíssima.
Todas as ações, cruéis, piedosas, ou indiferentes, são iguais.
Contudo, o homem não é igual a nenhum outro homem, bicho ou coisa.
Ninguém é igual a ninguém. Todo ser humano é estranho e ímpar.

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Saudade do que passou.


Confesso: sou saudosista.

Cada vez mais me compreendo assim e assumo essa marca de minha personalidade.

Tenho saudades de minha infância, adolescência.

Dos meus amigos. Dos primeiros amigos.

De Alda, filha de Mide, que brincava de Gata Pintada comigo e ríamos tanto porque, para mim, ela estava muito vermelha depois que eu lhe puxava muito as orelhas.

A música era mais ou menos assim:

“Gata pintada, quem te pintou?
Foi uma menina que por aqui passou
Tempo de areia
Levanta a poeira
Pega essa lagarta
E puxa as orelhas!”

Ela ficava vermelha de sorrir de mim que, segundo ela mesma, estava como um pimentão. Rs.

Ai, que saudade do pé de coco bem alto que tinha no fundo de nossa casa, Alda!

A gente ficava ouvindo o som do vento nas palhas do coqueiro. Ele ia uivando, como um lobo. Aquilo era amedrontador e maravilhoso ao mesmo tempo.

E quem não se lembra das vinhetas da Rádio Baiana de Jequié?

Hoje de manhã me peguei rindo de um texto que jamais me esqueci:

““Ô, moço! Me dê aí uma limonada!”
Pedindo dessa maneira você não comprará o remédio certo!
Quando for comprar diga assim: “Eu quero um vidro de Limonada Bezerra!”
É isso aí! Com a saúde não se brinca!”

Bons tempos aqueles.

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Nossa infância


Eu e Ivana nos sentamos à mesa (sempre à mesa) para prosear.

E o assunto havia sido sobre nossos brinquedinhos.

Já que papai não tinha dinheiro para nos comprar produtos industrializados e nunca tínhamos bonecas ou brinquedos, nós mesmos fazíamos nossas caixinhas, bonecas, carrinhos, mesinhas, cadeiras e outras coisas.

Isso tudo nos ajudou a entender que a vida é difícil e é com dificuldade e trabalho, além de muita criatividade, que atendemos às nossos necessidades.

Construir nossos próprios brinquedos era algo bom. Emocionante!

Ainda me lembro que ganhei de alguém uma lâmpada bem pequenina. Eu e Marquinhos adaptamos àquela pequena luz a uma pilha também pequena e conseguimos, assim, iluminar a casa da minha boneca.

Montei mesas com cadeiras. Sofás. Caminha. Tudo de material velho, caixas de fósforo e giz. Além de papel colorido.

Essa casinha era uma parte da estante. Quando fechava a porta, lá dentro ficava muito escuro e já que eu pensava que minha ‘filhinha’ teria, como eu tinha, medo de escuro, deixava sempre a luz acesa para iluminar aquele espaço.

Um dia briguei com Marcos. Não me lembro o porquê. Ele, com raiva, destruiu a casa de minha boneca e jogou todos os ‘móveis’ num terreno baldio que havia ao lado de nossa casa.

Junto da casa do Bicho Manjaléu.

(Poxa, Marquinhos! Até hoje eu não lhe perdoei por isso, viu?!)

Chorei muito nesse dia. Muito. Como é que alguém poderia ser assim? Sem coração? Uma pessoa terrível de cinco anos de idade, aproximadamente, que é capaz de destruir a mais linda casa de bonecas (e iluminada!) que existia! Será que ele não tinha coração?

E como é que eu ia enfrentar sozinha o Bicho Manjaléu para recolher todos os móveis e arrumar de novo a casa da boneca? Poxa! Quanto trabalho! Que medo!

Em pouco tempo aquela pessoa terrível e sem coração foi comigo, me protegendo do furioso imaginário Bicho e recolheu, numa caixa, tudo de volta.

E me ajudou a montar de novo a casa que, agora, ficou mais feliz e bonita.

Depois de ouvir toda essa história Sarinha comentou com seus brilhantes olhos verdes: “Puxa! Vocês faziam muita reciclagem quando eram crianças! Isso é maravilhoso!”

Eu e Ivana olhamos uma nos olhos da outra. Olhos arregalados. Que conclusão interessante de uma criança de seis anos…

O que Sarinha leu foi o contrário do que estávamos falando. Eu e Ivana falávamos de nossa pobreza e do quanto foi dura a nossa infância sem brinquedos.

Falar de reciclagem ou meio ambiente em nossa época, há mais ou menos vinte e cinco, trinta anos atrás era algo inusitado. Nem passavam em nossa mente infantil coisas desse tipo.

O mundo gira, as coisas mudam. O tempo passa.

Em nossa idade o que nos chamava a atenção era justamente nossa carência.

Para Sarinha o que importa é o meio ambiente. Provavelmente porque ela não entenda o que significa não ter. Ela tem tudo o que deseja… Suas demandas já são outras. Bem diferentes das nossas…

Penso que além disso prevalecem as diferenças culturais, as distâncias de gerações.

Há trinta anos não se falava com tanta naturalidade em meio ambiente ou reciclagem.

Nossas necessidades infantis eram outras. Nossos desejos, também.

Falar de lixo, material reciclado, meio ambiente, consumo e temas assim são sim, uma necessidade urgente. De todo o Cosmos.

Criança de hoje tem que falar dessas questões mesmo. Infelizmente.

Mas ainda temos crianças que, como nós em nossa infância, além de não terem visão ambiental, não possuírem bens e não puderem brincar, precisam trabalhar. Uma perversidade esse sistema capitalista!

E ainda se vê gente defendendo esse capitalismo desenfreado.

Que pena!

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Autonomia


Todas as vezes que Paulo Freire afirma que a história da vida da gente não é algo dado, acabado, definido e que, potencialmente, o homem tem a oportunidade de interferir em sua própria vida para mudar seu destino eu fico sinceramente frustrada comigo mesma.

O fato é que, embora saiba que algumas escolhas que adotei como estilo de vida tenham sido equivocadas eu ainda insisto em continuar em meu espaço de conforto (conforto questionável), me limitando a seguir na mesma linha, com o mesmo pensamento ingênuo e iludido de que é por aquele caminho mesmo que eu devo seguir.

A menos que surja alguém ou algo forte o suficiente para me impulsionar para cima e para frente, rompendo os desencontros com a felicidade, eu insisto na tendência de me manter no meu cantinho.

No lugar de sempre.

Ainda que infeliz e prejudicada.

Pessoas me instigam… situações me questionam.

Confesso que sair do lugar da acomodação é sempre uma tortura para mim.

Dar um passo além de mim mesma me emancipa, sim. Porém o seguir adiante, em momentos assim, é doloroso pois carrega no seu todo rompimentos, decisão. De-cisão. Cisão. Corte. Dor. Ferida.

Penso: mas a vida estava tão confortável, tão boa…

Eu já havia me acostumado com a rotina, com o suposto conforto, com a mesmice, com as migalhas que me foram oferecidas.

“O homem é condenado a ser livre.” É o que afirma o existencialista Kierkegaard.

Com essa afirmação eu tenho o peso da responsabilidade de ser livre.

Diante dessa liberdade eu sofro porque a liberdade implica escolha, que só eu mesma posso fazer.

Preferiria optar por não escolher.

Decidir não é lá a coisa mais fácil do mundo.

Mas “não agir” por si só, já é uma escolha.

E eu não tenho outra alternativa além de ser livre e aceitar a Graça como uma doce condição para minha vida.

Como naquele dia em que eu ia me afogando numa das praias de Itacaré – Ba e um desconhecido que até hoje não sei quem, me empurrou com os pés para o lado da areia.

Aos meus olhos ingênuos eu estava sendo agredida aquela pessoa.

De fato, alguém me estava salvando, me impulsionando para o lado melhor em que eu poderia respirar e tocar a vida até o fim. O lado da vida, da existência.

Coisa engraçada essa!

Eu nunca pude agradecer àquela pessoa pelo ‘empurrão’. Também não sei se ele tinha a noção sequer de que estava me salvando, mas foi exatamente isso o que aconteceu porque naquele momento eu não encontrava mais o chão do mar.

Ele, meu desconhecido, me salvou.

A quem quer que tenha sido o ajudador daquele dia em minha adolescência, queria agradecer. Estou viva hoje graças àquele momento. Dentre tantos outros.

Mesmo que eu não possa agir por mim há sempre alguém por perto para me dar uma dica, aclarar a visão e ajudar.

Se não uso a liberdade, se não consigo perceber a graça e a libertação, se não aceito ajuda dos outros, se não posso decidir por mim, ainda assim terei sempre, de alguma forma, uma nova chance.

Enquanto estiver viva.

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