IMPORTÂNCIA DA VIDA E DA OBRA DE FREUD…

Após devida autorização verbal, tenho a honra de postar o texto abaixo que é de um dos mais competentes e estudiosos Psicanalistas Clínicas daqui de Jequié.
Todas as quartas-feiras, há muito tempo, nos encontramos, juntos com outros Psicanalistas para estudarmos questões ligadas à Psicanálise Clínica. Passamos por vários autores, terminamos fazendo análise de grupo e é, realmente, para mim, uma grande experiência poder estar acompanhada de tão boa gente.
Djalma tem um arcabouço bibliotecário invejável. É um leitor compulsivo (isso também é uma questão pscanalítica. Rs).
Gosto de suas provocações. Gosto de seu pensamento crítico, embora discorde dele em vários aspectos. No fundo, nós nos admiramos, eu sei.
Então, abaixo, o texto do meu amigo. Sempre falo que ele me enriquece com bens teóricos. Espero que todos gostem.

IMPORTÂNCIA DA VIDA E DA OBRA DE FREUD NA PSICANÁLISE
E SUA MANIFESTAÇÃO NA ATUALIDADE
Por Dijalma Galvão Oliveira
A história do homem é marcada por grandes descobertas. A teoria daevolução das espécies, de Charles Darwin, os estudos de Isaac Newton sobre a gravidade, a física quântica atual e tantos outros que poderíamos relatar. Todas elas causaram grande impacto no desenvolvimento da humanidade. Entretanto, nenhuma se compara ao feitode Sigmund Freud. Uma viagem ao interior do ser humano. A descobertado inconsciente e suas implicações na patologia da vida mental.
Sigmund Freud (Sigismund Schlomo Freud até os 21 anos) nasceu a 6 de maio de 1856 em Freiberg, Moravia, no império austro-húngaro (hoje Pribor, Checoslováquia). Filho de Jacob Freud, um comerciante judeu, e de sua jovem segunda esposa Amália Nathanson, Freud tinha irmãos do primeiro casamento do pai com Sally Kanner, falecida em 1852, que eram cerca de vinte anos mais velhos que ele. Em 1860, devido à falência donegócio do pai, sua família mudou-se para Viena; Freud tinha 4 anos.
Aos nove anos Freud entrou para a escola onde teve um aproveitamento acima da média. Para sua formação superior, matriculou-se na Universidade de Viena em 1873.
A relação de Freud com a “futura” psicanálise deu-se a partir do acompanhamento de uma paciente do Dr. Josef Breuer, conhecida clinicamente por Anna O. Tratava-se de uma jovem de vinte e um anos, com sérios problemas de histeria e que era tratada com métodos de hipnose. Fascinado pelos resultados obtidos pelo Dr. Josef Breuer com essa técnica, Freud decide dedicar-se ao assunto e muda-se para Paris onde vai trabalhar com um renomado médico, especialista no método da hipnose, chamado Dr. Jean-Martin Charcot. Em pouco tempo Freud percebeu que a técnica da hipnose poderia ser substituída pela conversa com o paciente.
Substituindo definitivamente a hipnose pela conversação, Freud passou a utilizar o divã para colocar seus pacientes em uma posição de conforto e através da livre associação de idéias levava-os ao encontro de seus traumas fazendo-os conscientes dos motivos de seus problemas.
Essa nova técnica possibilitou a Freud descobrir que a mente humana não trabalha apenas com a consciência. Existem fatos que, por motivos diversos, são “guardados” fora da consciência. Ou seja, estão em um estado inconsciente.
Mas nós chegamos ao termo ou conceito de inconsciente ao longo de outro caminho, pela consideração de certas experiências em que a dinâmica mental desempenha um papel. Descobrimos – isto é, fomos obrigados a presumir – que existem idéias ou processos mentais muito poderosos (e aqui um fator quantitativo ou econômico entra em questão pela primeira vez) que podem produzir na vida mental todos os efeitos que as idéias comuns produzem (inclusive certos efeitos que podem, por sua vez, tornar-se conscientes como idéias), embora eles próprios nãose tornem conscientes (FREUD, 1997, p.12).

As experiências vivenciadas pelos seus pacientes levaram Freud a desenvolver estudos sobre a sexualidade e determinar a sua importância na construção de diversos traumas e neuroses. Deparando-se com o fato inarredável da universalidade das chamadas perversões sexuais em seus pacientes, Freud conclui que a sexualidade humana apresenta uma verdadeira “constituição sexual” que assume o lugar de uma “disposição neuropática geral”, formulação através da qual ele torna inexistente a fronteira entre o normal e o patológico (JORGE, 2005, p.21).

Devido ao tabu que significava o sexo àquela época, Freud sofreu a ira e a humilhação de seus pares ao apresentar suas teorias relacionadas aos desejos sexuais durante um congresso médico. Dado a ineditismos, Freud passou a analisar seus próprios sonhos e como resultado escreveu uma das suas mais importantes obras, a Interpretação dos sonhos.
Considerado pelo próprio Freud um livro de “leitura difícil”, A interpretação dos sonhos (1900) é um trabalho cuja extensão requer grande fôlego para ser abordado. Nele, Freud introduz uma enorme massa de elementos novos, que lhe era exigida para formular sua primeira teoria do inconsciente num grau de abrangência que expunha a congruência existente entre uma função comum a todo sujeito – o sonho – e os mecanismos encontrados pela psicanálise na estrutura neurótica (JORGE, 2005, p.125).

No ano de 1908, Freud, juntamente com outros médicos interessados na teoria psicanalítica, entre eles Carl Gustav Jung, fundaram a Sociedade psicanalítica de Viena, a qual, dois anos depois, se tornaria a Associação Internacional de Psicanálise.
Desde a publicação, em 1895 do texto Estudos sobre a histeria, onde Freud e Breuer discutiam o caso de Ana O, até os dias de hoje a psicanálise, assim como as outras ciências, tem acompanhado a evolução do homem e se adaptado para atender as novas necessidades que dela são exigidas. Essa nova conjuntura trouxe, e não poderia ser de outra forma, várias correntes de pensamento onde as idéias de Freud são mantidas e defendidas por umas e criticadas e consideradas ultrapassadas por outras.

É desnecessário dizer que descobertas e preferências teóricas diferentes desenvolveram-se em diversas partes do mundo. A evolução da psicanálise na América do Norte seguiu várias trajetórias distintas.
Enquanto para alguns psicanalistas a teoria das relações objetais substituiu a psicologia do ego de Freud, outros psicanalistas mantêm um comprometimento com as teorias inicias de Freud e com teorias mais contemporâneas – uma tendência a fim da teoria das pulsões em conjunção com a teoria das relações objetais. Entretanto, alguns psicanalistas ainda seguem quase que inteiramente a teoria das pulsões, ao passo que outros aderem quase exclusivamente à teoria das
relações objetais. No presente momento, os psicanalistas do mundo inteiro não estão unificados em uma única visão da vida mental. O “pluralismo teórico” domina a cena psicanalítica (ETHEL, 2007, p.15).

O pluralismo teórico a que Ethel faz referência é importante e necessário ao processo de desenvolvimento humano. É no campo das idéias que se constrói no presente, baseado no passado e com a visão no futuro. O fato é que o trabalho de Freud em desvendar as áreas
obscuras da mente humana possibilitou conhecer melhor o homem, entender suas fraquezas e melhorar a qualidade de vida das pessoas. Por mais que se discuta se as teorias freudianas estão ou não corretas, não vai mudar o fato de que elas deram um passo enorme na construção do imaginário humano ideal.

REFERÊNCIAS
FREUD, Sigmund. O ego e o id. Trad. José Otávio de Aguiar Abreu. Rio de Janeiro: Imago, 1997.
JORGE, Marco Antonio Coutinho. Fundamentos da psicanálise de Freud a Lacan, v.1: as bases conceituais. 4ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.
NASIO, J. –D. Lições sobre os sete conceitos cruciais da psicanálise. Trad. Vera Ribeiro. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.
NASIO, Juan-David. Como trabalha um psicanalista? Trad. Lucy Magalhães. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.
PERSON, Ethel S. Compêndio de psicanálise [organizadores] Ethel S. Person, Arnold M. Cooper e Glen O. Gabbard. Trad. Daniel Bueno. Porto Alegre: Artmed, 2007.
http://www.cobra.pages.nom.br/ecp-freud.html. Acessado às 22:21 horas do dia 24.06.2007.

LONGE DE CASA…

Seu desejo era apenas um: voltar para casa. Mas a cada tentativa, depois da guerra entre a Grécia e Tróia, algum detalhe, algum pequeno erro, qualquer vacilo de seus marinheiros, fazia o caminho impeditivo: chegar em casa, ver sua mulher e seu filho era tarefa insistentemente perseguida para Ulisses, segundo a lenda de Homero.

Para o filho pródigo, narrado na Escritura, não foi tão difícil. No momento em que o moço caiu em si, pode baixar a guarda e afirmar: vou voltar e pedir a meu pai que me deixe viver como vivem seus empregados. E foi festa, foi anel no dedo, roupas novas, vinho novo. Ao ponto de incitar ciúmes no irmão mais velho que, irado por ver o vulto de seu retorno, contundiu com o pai sobre o porque de tanto amor a alguém que não o merecia.

Alguns pacientes em Psicanálise estão assim: hora são dependentes de seus pais. Outra, da namoradinha. Depois, dependem de status. Em seguida, viciam-se por drogas. Por bebidas. Por dinheiro. Vícios que, na realidade são substituídos pelo apropriado e difícil caminho do auto-conhecimento.

Voltar para casa, do ponto de vista psicológico, está ligado a voltar para si mesmo. Voltar-se para seu próprio eu, que deverá e poderá ser fortalecido pela reconstrução de sua própria história, pela re-elaboração de sua auto-estima, pela descoberta do valor da sua vida – ainda que a seus próprios olhos sua vida não tenha sido e nem seja das melhores.

O primeiro passo para o auto-conhecimento seria o retorno a si mesmo. É dar um passo aquém de mim. É rever meus princípios, meus valores. Perceber em que posso produzir, valorar minha vida. Quanto de lição, de amor, bondade, alegria vivi. Qual sentido dei e dou à minha existência. O segundo passo seria traçado a partir do outro. Do não-eu. Do sujeito social que há além de mim. Que é construído, sim, por mim, mas tendo como ponto de partida o meu par. O outro que não sou eu. E isso está além de mim.

No caso de Ulisses, qualquer vacilo cometido significaria mais algumas milhas para o retorno à sua casa. Mas Ulisses não perdia as esperanças, o rumo. Ele queria mais do que tudo, cumprir seu desejo de chegar. Retornar para casa movia sua vida, dava-lhe coragem e forças para enfrentar monstros, mares, tempestades, medos, poderes. Ele não se deixava abater. Esta é uma grande lição. Não desistir nunca de seus sonhos é um tema que já virou lugar comum na saga humana.

O filho pródigo quis retornar ao Pai. Esse movimento que toca o espiritual e está distante desse emaranhado religioso que tem parecido moda no Brasil. Retornar ao Pai foi, para o filho pródigo, um grande retorno às suas raízes, à sua identidade. Voltar é sempre bom quando se está sendo esperado e, de fato, o melhor momento da viagem é o retorno para casa.

O caminho do auto-conhecimento não é algo fácil. Não mesmo. Dói, dói muito. Fere, machuca. Todavia é uma odisséia para a qual todo homem e toda mulher deveria estar motivado a fim de resgatar sua história, ressignificar suas origens, seus revezes. Dar novo fôlego à sua existência, re-elaborar sua dor e construir, a partir de tudo isso, sua realização pessoal ou um forte motivo para seguir adiante. Já dizia o poeta que navegar é preciso. Sim, meu caro. Viver também o é.

Que haja alegria em nossos horizontes. Esperança em nossos passos e vontade de chegar em casa. Acima de tudo, coragem de chegar em si, no seu canto existencial, assumindo-se como gente, como ser humano.

Homero nos deixa a lição da coragem e da perseverança para seguirmos nosso caminho. Provavelmente Ulisses não pode desfrutar dos braços ternos, belos e dóceis de sua amada. Mas Ulisses seguiu adiante, perdendo homens, vivenciando horrores. O medo de cada esperiência não foi maior que a insistente e teimosa vontade de se realizar como homem, acima do herói.

O filho pródigo nos ensina o poder da humildade. Sua consciência de que viver entre porcos não era algo para ele o levou a pedir desculpas e retornar para casa. Se voltar para casa é algo maravilhoso, imagine para alguém que já nem tinha esperanças de que isso seria possível algum dia?


Nos dois casos, a consciência de que era necessário retornar justificava vencer qualquer obstáculo. Nada era motivo de desistir do calor paterno (para o Filho pródigo), dos braços da mulher amada e do sorriso do filho (Para Ulisses). Ter a consciência fortalecida é tarefa primordial em Psicanálise. Esse caminho nos leva de volta para casa. Nos acalenta e alma e dá saúde ao corpo.