Saudade do que passou.


Confesso: sou saudosista.

Cada vez mais me compreendo assim e assumo essa marca de minha personalidade.

Tenho saudades de minha infância, adolescência.

Dos meus amigos. Dos primeiros amigos.

De Alda, filha de Mide, que brincava de Gata Pintada comigo e ríamos tanto porque, para mim, ela estava muito vermelha depois que eu lhe puxava muito as orelhas.

A música era mais ou menos assim:

“Gata pintada, quem te pintou?
Foi uma menina que por aqui passou
Tempo de areia
Levanta a poeira
Pega essa lagarta
E puxa as orelhas!”

Ela ficava vermelha de sorrir de mim que, segundo ela mesma, estava como um pimentão. Rs.

Ai, que saudade do pé de coco bem alto que tinha no fundo de nossa casa, Alda!

A gente ficava ouvindo o som do vento nas palhas do coqueiro. Ele ia uivando, como um lobo. Aquilo era amedrontador e maravilhoso ao mesmo tempo.

E quem não se lembra das vinhetas da Rádio Baiana de Jequié?

Hoje de manhã me peguei rindo de um texto que jamais me esqueci:

““Ô, moço! Me dê aí uma limonada!”
Pedindo dessa maneira você não comprará o remédio certo!
Quando for comprar diga assim: “Eu quero um vidro de Limonada Bezerra!”
É isso aí! Com a saúde não se brinca!”

Bons tempos aqueles.

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Para quem mora longe…

Há uma pesquisa da BBC, em Londres, que indica que Saudade é a 7ª palavra mais difícil de traduzir.

Você pode sentir saudades de várias coisas e/ou pessoas. Até de tempos e situações vividas anteriormente. Tem gente que sente saudades do que nunca viveu.

Para a Wikipédia, “a palavra vem do latim “solitas, solitatis” (solidão), na forma arcaica de “soedade, soidade e suidade” e sob influência de “saúde” e “saudar”. No fado e na música popular, a saudade e a partida são temas constantes.”

Já senti saudade até do cheiro de café vindo da cozinha de manhã cedo.

Estar longe de casa significa ter, quando a gente menos espera, o coração apertado pela saudade.

Saudade é coisa séria.

Estive longe, diversas vezes, de quem amei. E volta e meia estou distante de quem amo. Em alguns momentos a gente está perto e ainda sente falta um do outro. Curioso!

Rubem Alves, em Sobre o Tempo e a EternaIdade, traduz um pouco esse sentimento:

“Assim são os meus mapas.

Olho para vastos espaços.

Identifico rios, montanhas, mares, cidades.

Não me dizem coisa alguma.

Não me produzem nenhum riso.

Mas há uns poucos lugares que brilham como estrelas.

São lugares onde moram pessoas que eu amo.

Somente os amantes sabem que os mapas facilmente se transformam em corpos.

Basta, para isso, que a despedida aconteça…”

Há poesias, contos, reclames, murmurações, lamentos, músicas e muitas outras expressões artísticas que tentam expressar este tipo de sentimento. Tanto se canta sobre a saudade… Tanto se fala sobre a distância do que ou de quem amamos…

ALVES ainda sinaliza:

“A saudade faz bem ao amor, pois que é justamente na dor da separação que o coração faz a operação mágica de re-encantar os amantes que o cotidiano só faz banalizar. Saudade é um buraco dolorido na alma. A presença de uma ausência. A gente sabe que alguma coisa está faltando. Um pedaço nos foi arrancado. Tudo fica ruim. A saudade fica uma aura que nos rodeia… Infelizmente, o amor é feito com muitos nunca mais” – a expressão mais triste que existe”.

Há uma certa beleza nisso que também fere o coração.

Ontem à noite Nietzsche foi meu companheiro. Vi também Jesus Cristo e seu Sermão do Monte. Dormi em paz.